segunda-feira, 31 de dezembro de 2012


                                    ÀQUELES QUE FORAM OS PRIMEIROS MÁRTIRES

É mais que sabido que ao longo da história do cristianismo muitos homens e mulheres, por conta de sua fé, derramaram seu sangue por Cristo. Contudo, ainda que não ocupem esta galeria ao lado das figuras mais representativas deste cristianismo construído com sangue e suor, não devemos esquecer os meninos de Belém.

Sabemos por meio da pena do evangelista Mateus que Herodes Magno, empenhado em tirar a vida do menino Jesus, promove um brutal infanticídio na cidade de Belém. Incapaz de identificar o menino Jesus, nascido sob os auspícios do messianismo, o que poderia pôr fim ao seu reinado, Herodes não hesita. Então, movido por sua obsessão pelo poder, o governador da Judéia, num ato de pura insanidade, mandou sua soldadesca degolar todos os meninos belemitas com menos de dois anos. Inglório fora seu esforço, já que Cristo e seus pais encontravam-se refugiados no Egito (Mt 2.13-18).   

Chamou-me a atenção este texto pela perspectiva de reflexão que o nascimento de Cristo já nos oferece. Ora, parece tão incoerente versar sobre este assunto num período em que os homens se ocupam com tantas outras questões. A impressão que temos é que, em época natalina, somos arrebatados por um frenesi alienante. Não pensamos nada mais que festas, viagens e compras. Tais coisas possuem sua importância e valor, porém devem ocupar um segundo plano no tempo natalino.

Assim sendo, considerando a narrativa em questão, no Natal Cristo nos convida a olhar com ternura a infância que por razões as mais diversas pode se perder. Não podemos negar que ao longo do tempo a figura herodiana tem assumido as mais diferentes formas.

Em certos momentos, ela vinha representada por meio de um sistema político que concorria contra tudo aquilo que é natural à puerícia infantil. Pensemos então nos estados totalitários que, em nome das “razões do Estado”, submetem suas crianças a uma disciplina ideológica castradora. Isto para não falarmos dos clãs de guerrilhas que, em nome de sua causa, não hesitam em alistar crianças dando-lhes fuzis no lugar de bolas de futebol e bonecas.

Porém, não apenas o Estado carrega esta nódoa culposa contra si. A crítica aqui ainda é cabível à família e à sociedade. Pais que praticamente abandonam seus filhos à própria sorte, transferindo para a escola, instituições filantrópicas e o Estado uma responsabilidade que é apenas sua. Careceríamos ainda tempo e espaço para discorrermos questões relacionadas ao aborto, abandono de incapaz e homicídio doloso que genitores cometem contra seus rebentos.

Mas não poderíamos isentar a Igreja de suas responsabilidades. Esta dispõe de recursos humanos e materiais, mas permanece indiferente à formação integral de seus pequenos frequentadores. Quando não, nada mais que lhes transmitir alguns princípios e valores de natureza moral e cristã. E isto ocorre por conta do sacerdócio de professores cristãos que, quase que em sua maioria, não possuem formação apropriada para isto recorrendo apenas a seu esforço e boa vontade.

Por muitas vezes lamentei o desperdício de recursos humanos que temos, mas que não sabemos aproveitar. Quantos psicólogos, pedagogos, advogados, médicos dentre outros, ocupam os bancos de nossas igrejas sem nos valermos de seus dons e instrumentos. Pois bem, não fosse nossa indiferença em relação a esta nobre causa, nossas crianças poderiam receber da Igreja boa orientação cívica, sexual, ética além da cristã, obviamente.       

Sobre aqueles primeiros mártires em Belém, Agostinho versejou: “Flores dos mártires que se fecharam para sempre no seio frio da infidelidade”. Contudo, este “seio frio da infidelidade” parece insaciável nesse seu afã voraz contra nossos pequeninos.

 

 

Graça e Paz a todos

Pr Luis Claudio

terça-feira, 25 de dezembro de 2012


APESAR DE TUDO, MARIA O CARREGAVA EM SEU VENTRE

Por conta das querelas teológicas e políticas envolvendo católicos e protestantes, estes, com o passar dos séculos, parecem ter esquecido o testemunho de fé de Maria. De fato, dadas suas desavenças com os movimentos marianos, os protestantes ou os movimentos cristãos não católicos dirigem seu olhar a Maria com certa desconfiança, para não serem confundidos com aqueles.

Porém, devemos ressaltar que ainda que não comunguemos com os dogmas da Imaculada Conceição ou a Assunção, não podemos esquecer do grande testemunho de fé que Maia nos deixou. Para tano, basta corrermos as páginas dos Evangelhos para tão logo nos saltar aos olhos sua história de resignação.

Surpreendida pelo anúncio dado por Gabriel de que conceberia o Redentor, Maria sente-se confusa, haja vista ainda ser uma virgem. O anjo logo lhe conforta ao dizer que aquela obra seria uma ação do Espírito Santo, contrariando a via natural para um nascimento comum. Sem maiores hesitações, a virgem escolhida logo exclama: “Eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1.38)

Doravante, até o nascimento de Cristo, não seriam poucos os padecimentos sobrevindos à Maria por conta daquela sua gravidez incomum. A primeira grande crise por ela enfrentada foi de caráter conjugal. José, seu esposo, assim que soube de sua gestação intentou abandoná-la. Para guardá-la dos impropérios daquela sociedade, e até mesmo de uma lapidação, José resolve fugir como que assumindo uma paternidade que não era sua. Advertido em sonhos por um anjo, ele logo retorna ao seio de sua amada (Mt 1.18-25).

Ora, não fosse o acolhimento de José, a virgem grávida correria grande risco de morte, já que a suposição de um adultério seria penalizada com o apedrejamento. Todavia, mesmo diante desse risco, Maria não hesita em abortar o filho que esperava nascer.

Ainda nos dias de Orígenes, filósofo cristão de Alexandria, em que viveu no século I, permite-nos ampliar a dimensão do quanto Maria sofreu por conta daquela sua gravidez. Incapaz de aceitar uma obra do Espírito Santo, a imaginação ímpia logo tratou de populariza a ideia de que Maria tivera um caso adulterino com um soldado romano chamado Pantera.

Enfim, ainda que tenha sofrido acusações que ofendiam suas virtudes morais; mesmo à iminência de perder seu esposo, seu filho e a própria vida, Maria cumpriu incondicionalmente aquilo que Deus havia proposto-lhe. Diante de todas as adversidades que lhe sobrevieram, Maria em momento algum pensou em abortar a criança que em seu ventre se encontrava.

Quantas lições não aprendemos com ela! Ora, por muito menos ensaiamos abandonar nossa fé e abortar de nossa alma o Cristo que lá habita. Diante dos desconfortos que julgamos ser decorrentes de nossa vida cristã, ameaçamos romper nossa relação com o Redentor, abandonando-o durante a caminhada. Retomemos o exemplo de Maria que, mesmo sob o peso de uma gestação que tantas consequências poderia trazer-lhe, não abortou o Cristo dentro de si. Que nesta noite de natalícia possamos renovar nossos votos de amor a Cristo, prometendo-lhe levá-lo em nossas almas ainda que as circunstâncias sejam as mais hostis.

 

Graça e Paz a todos, e um feliz Natal

 

Pr. Luis Claudio      

           

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012


AINDA SOBRE OS PASTORES E O MENINO JESUS

O prestígio que a literatura bíblica tributou à figura do pastor não concorre com sua importância social. Figuras notáveis da história de Israel, como Moisés e Davi, para não falarmos de outras, desempenharam o ofício de pastor. Contudo, a sociedade judaica dos dias de Jesus não conservava por seus zagais o mesmo apreço. Resta que o testemunho de um pastor sequer possuía validade jurídica, uma vez que era excluído, por sua condição social, dos processos nos tribunais.

Porém, são os pastores que vemos naquela manjedoura, adorando o menino Jesus. Ali não se encontrava um fariseu ou qualquer outra personagem ilustre da cena judaica. Não veremos naquela gruta um ministro do templo nem uma grande autoridade política. Pessoas desta envergadura encontramos conspirando contra o Cristo. Vociferam contra ele ávidas em vê-lo pendurado na cruz.

Na manjedoura veremos apenas humildes pastores, homens sobre os quais pesavam os impropérios do descaso. Todavia, recebem do anjo, naquela que parecia uma noite qualquer, o memorável anúncio: ”Nasceu-vos hoje um Salvador, que é o Cristo-Senhor” (Lc 2.11).

Deus agora busca agregar em torno de si, homens que por conta de sua condição social parecem identificar-se com os rincões do mundo. Homens sobre os quais pesavam os estigmas da discriminação. Homens que não ocupavam os melhores lugares no Templo ou nas sinagogas, separados que estavam dos demais por abismos que nossa mediocridade cava.

Se há uma novidade que logo se percebe no Cristo em sua mais tenra idade, ela consiste no desejo de Deus em romper entre os homens as distâncias que lhes separam. É este seu desejo que conduz aqueles pastores a uma simples manjedoura que, naquela noite, tornava-se o centro do universo, de onde jorravam as primeiras correntes da graça celestial.    

             

Graça e Paz a todos

Pr Luis Claudio

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012


OS PASTORES DE BELÉM VISITAM O MENINO JESUS

Dentre os evangelhos chamados canônicos, apenas Mateus e Lucas dedicaram algumas páginas com narrativas sobre a infância de Jesus. Entre ambos, podemos destacar, ao menos aqui, um contraste quanto ao ambiente em que se deu o nascimento de Cristo. Se por um lado Mateus apresenta-nos uma atmosfera mais densa como fundo ao advento, coube à pena lucana pintar a natividade com cores vivazes, em tons festivos. Porém, não apenas o cenário é contrastante entre ambos os autores, mas também certas personagens que acentuam a perspectiva que cada evangelista pretende dar ao episódio. Assim, se em Mateus o menino Jesus recebe a visita de magos, na narrativa lucana serão os pastores convidados a prestar tais honras.

Diz-nos Lucas que, logo após o nascimento de Cristo, uma miríade de anjos apareceu a pastores que guardavam seus rebanhos. Não sabemos precisar quantos pastores havia ali, embora, em sua “Natividade”, Giotto tenha pintado dois pastores apenas. Avisados sobre o nascimento do Salvador, aquelas personagens deixaram de pastorejar e, céleres, aligeiraram seus pés rumo à manjedoura.

Não são poucas as razões que o texto oferece-nos à reflexão. Dele já podemos divisar o caráter inclusivo do amor de Deus entrançado na textura frágil daquele menino. Ainda que celebrados na literatura do Antigo Nascimento, numa via sociológica os pastores eram figuras desdenhadas pelas classes judaicas mais abastadas.       

Ainda sobre o anúncio, é digno de nota recordarmos que os pastores são provados em sua fé, já que nada além de um menino esperam encontrar em Belém. Não correm para a manjedoura a fim de encontrar um político poderoso ou uma figura taumatúrgica. Acorrem para aquela estrebaria apenas para verem uma criança. Cena tão contrastante com a que estamos habituados a ver em nossos templos. Igrejas apinhadas de pessoas que, certamente, não se interessariam em ver apenas um menino. Querem muito mais que isto; assim projetam na figura de Deus a imagem do advogado, médico, banqueiro, curandeiro etc.     

Não careceríamos de profundo exercício intelectual para prevermos a reação desses auditórios, se soubessem que nada mais encontrariam no templo que um menino envolto em panos rotos. Contudo, Deus acentua com isto toda sua grandeza, já que é capaz de encerrar sua magnificência na compleição frágil de um bebê. Diante de gesto tão nobre, o poeta John Donne não poupa sua verve e exclama diante da “imensidão enclausurada” no ventre de Maria.

Graça e paz a todos.  

Pr Luis Claudio

domingo, 2 de dezembro de 2012


O NATAL DE CRISTO É O INVERSO DE VERSOS ESMAECIDOS

Entramos no mês de dezembro e o ocidente cristão celebra sua maior festa: o Natal. Ensejando a ocasião, proponho-me tecer algumas reflexões pertinentes à época. Para tanto, recorro a um romance que, ao meu ver, apresenta o nascimento de Cristo como prenúncio de novos tempos.

Em seu romance “O mártir do Gólgota”, Henrique Perez Escrich fala-nos de uma personagem da mitologia grega, conhecida como a Sibila de Cuma, que desce até o Hades para dar uma notícia ao censor Ápio Claudio Crasso.

Esta Sibila trajava uma túnica preta e uma coroa de folhas secas cingia-lhe a fronte. Portava um bordão de haste metálica, em cujo extremo havia um ornato formado de cinco cabecinhas de víboras. Caminhava descalça e parecia muito fatigada. Ela então se deteve por um momento e sentou-se sobre o túmulo de Ápio, dirigindo-lhe as seguintes palavras: “Têmis ordenou às suas filhas que reúnam por alguns dias o fio da minha vida, pois que trago a última mensagem do Oráculo de Delfos do divino Apolo que já não responde às perguntas que lhe são dirigidas. Os deuses estremecem e tombam dos pedestais, fugindo precipitadamente para a caverna de Plutão, onde haverão de chorar eternamente a sua impotência. O Titão do Cáucaso, o divino ladrão, o soberbo Prometeu quebrou suas cadeias e viu morrer sobre o peito ensangüentado o corvo insaciável; Júpiter, rei dos deuses e dos homens, vacila em seu trono de marfim: caiu-lhe o cetro das mãos e os raios queimaram-lhe a fronte. Minerva fechou o livro da sabedoria. Vesta, com terror, viu extinguir-se o fogo sagrado. Partiu-se em três o escudo de Palas. A coroa de espigas da frutífera Ceres secou-se-lhe na fronte. Vênus, filha do amor e da beleza, chora a ingratidão de Eros. Diana percorre os bosques desolada porque suas flechas são impotentes contra os cervos. Mercúrio perdeu as asas e caiu-lhe a bolsa que trazia na mão. Marte sentiu temor no coração. A bela cabeleira de Apolo encaneceu numa noite apenas; sua famosa lira cessou de vibrar, e as nove Musas, filhas de Júpiter e de Mnemósina, choram amargamente, percorrendo os montes do Pireu, de Helicon e do Parnaso”.

Nisto, a voz do túmulo exclamou: “Basta, basta, fantasma evocado pelo Averno, espírito infernal que vens perturbar, com as tuas palavras, o tranqüilo sono da morte. Vai-te: deixa-me repousar em paz no seio deste frio mármore que encerra as minhas cinzas, e não queiras pintar-me a ruína dos deuses do Olimpo”.

Nisto a Sibila falou-lhe: “Dorme em paz, Ápio; mas se a tua alma vaga errante nas regiões do desconhecido em busca em busca de um perdão que não te podem conceder os deuses pagãos, dirige-a para Israel, a terra prometida, onde nasceu o verdadeiro Deus, o salvador do mundo, o Messias, anunciado pelos Profetas”.

“E que nome tem esse Deus?”, indagou Ápio. No que a Sibila respondeu-lhe: “Chama-se Jesus; será o Redentor do mundo”.   

De fato, hoje não mais frequentamos o panteão dos deuses gregos, para ali depositarmos nossas oferendas. Contudo, cada época insiste em criar seu próprio templo, lugar em que eleva suas divindades. Nossa época presenciou a apoteose da técnica, da ciência e do capital. Contudo, é desnecessário dizer que não encontramos neles nossa redenção. Entretanto, faz-se desnecessário elencarmos as evidências que acentuam esta verdade. De sorte que, por mais conflitante que isto pareça, Deus ainda pretende encontrar-se conosco no fundo escuro e roto daquela manjedoura. É dali que brota a vida que inverte a nossa lógica, e já desnuda o advento de uma novidade que é, em quaisquer tempos, o desarranjo de um mundo cansado de seus próprios protótipos.

 

Graça e Paz a todos

Pr. Luis Claudio                 

 

 

terça-feira, 27 de novembro de 2012


SENDO DEUS NÃO REJEITOU TAMBÉM SER FILHO DE JOSÉ (Jo 1.45-51)

 

O texto que ora lemos narra o encontro que Cristo teve com Natanael. Ao menos nesta hora, chama-nos a atenção a maneira irônica com a qual Natanael acolhe a boa nova que Felipe lhe traz. Este, tomado por vivaz descoberta, diz àquele ter encontrado a razão da esperança judaica, qual seja, o Cristo. Cético, Natanael lhe moteja: “De Nazaré pode sair algo de bom?” (Jo 1.46).

Havia na apresentação de Felipe alguns pressupostos que fizeram Natanael desacreditar da veracidade de sua notícia. Ora, Cristo é aqui pintado como nazareno e filho de José. De fato, Nazaré não passava de um vilarejo empobrecido, que sequer se encontrava nos mapas de então. O nome de seu pai, José, pareceu-lhe tão comum que pouca importância lhe mereceu. Não restou a Natanael outra coisa senão um olhar determinista a tudo aquilo que ouvira.

A reação deste homem é própria daqueles que se limitam às circunstâncias. Para estes a pobreza e a miséria são como terra estéril, chão infecundo onde nada mais viceja.  Sua forma limitada de ver a vida faz-lhes pensar que alguns homens nasceram sob o signo da fatalidade, e que de uma condição de penúria e adversidade outra sorte não está lhes reservada.  

Que grandeza contemplamos em Deus, capaz de prover-nos do maravilhoso em meio às circunstâncias mais desfavoráveis. Faltou a Natanael a sensibilidade quanto ao admirável, a certeza de que a vida é tão grande que não podemos contê-la na bitola de nossas superstições ou preconceitos. O coração de um ensoberbecido não consegue dilatar-se para alcançar toda grandeza da vida.        

Homens como Natanael desconfiam que da pena de homem errante, quase que a viver na mendicância, como Camões, possa brotar a maior riqueza da épica portuguesa. Quem olhasse para Miguel de Cervantes trabalhando como criado para jovens ricos, na Universidade de Salamanca, jamais suspeitaria estar diante do maior escritor que a língua espanhola conheceu. Os professores do Conservatório de Milão rejeitaram o jovem Verdi, não vendo nele mais que um mancebo desajeitado diante de um teclado. Anos depois, não apenas por reparar tal injustiça, mas reconhecendo a genialidade do músico, aqueles docentes deram à academia de Milão o nome de Conservatório Verdi. Falta-me tempo e espaço para recorrer a tantos outros exemplos semelhantes.        

Disso decorre que o gesto sobranceiro de Natanael encerra aquele olhar esvaído de esperança, que desacredita da grandeza do homem, de Deus. Nele apercebemos o próprio inferno antecipado em vida, pois nada mais esperam os que para lá descem. Faz-nos lembrar a recomendação no frontispício do Inferno, que Dante Alighieri teceu em sua Divina Comédia: “Deixai aqui todas as esperanças, ó vós que entrais”.

Cristo não vinha de Nazaré, simplesmente passara por lá, já que sua origem era o Céu. Entretanto, não lhe ofende ser chamado de nazareno ou filho de José, já que títulos assim não o apequenam. Apequenada é a alma medíocre, a quem a história e Deus não se cansam de oferecer grandes lições.     

 

Graça e paz a todos.

Pr. Luis Claudio

 

 

quarta-feira, 21 de novembro de 2012


DORMINDO COMO UM HOMEM, DESPERTANDO COMO DEUS (Mc 4.35-41)

Após um dia intenso, não é de se espantar que Cristo poste-se em um recanto do barco e durma. A caminho da região dos gerasenos, ele aproveita o intervalo e dorme. Neste entreposto, uma tempestade aventa soçobrar o barco em que estava juntamente com seus discípulos. Estes, convencidos agora que seria inglória sua luta para que a nau não naufragasse, protestam quanto a aparente indiferença de Cristo ao fim fatídico que se desenha. Cristo então desperta de seu sono e faz com que o mar retome sua bonança.

Uma ou outra vez somos tentados a comparar o curso de nossas vidas àquela nau açoitada pelas mais diversas intempéries. E nesses momentos, parece-me ainda que o vejo dormir na proa da barqueta, o que me inquieta profundamente.

Tal inquietação leva-me a supor que ele pouca conta faz das borrascas que me machucam. Diante de seu sono percebo o quanto estou sujeito à tentação. Logo o renuncio com palavras, e não vejo melhor caminho senão concordar com aqueles que defendem sua inexistência.  

Porém, antes que me domine este sentimento a absoluta descrença, evoca a última expressão da piedade: a oração. A oração é o brado de desespero daquele que se vê diante do nada. Mas também o ponto em que se ligam o finito e o infinito, o eterno e o temporal, o relativo e o absoluto.   

Sozinhos no barco toda vida seria uma construção vã, uma luta inglória diante daquilo que é maior que nós. Dormindo no barco, Cristo não está imerso em nossos labores, mas sintonizado com nossas expressões espirituais mais elevadas.

Assim sendo, se reduzo minha vida àquela embarcação, convenço-me da realidade das intempéries. E assusto em imaginar que não lhe incomoda o estridor do trovão, o bramido da chuva e o fragor das ondas. Talvez porque sua audição consiga estender-se a acordes celestiais, quando nada mais conseguimos ouvir senão o caos que nos acerca. Entretanto, por graça infinita, Cristo se deixa ser afetado pelo palpitar de nosso coração aflito e o brado de uma alma em desespero. O que segue daí é a bonança que contrasta com um possível final trágico, se Cristo não estivesse em nosso barco.

Graça e paz a todos.

Pr. Claudio

 

domingo, 18 de novembro de 2012


O EVANGELHO DOS MARQUETEIROS

Recentemente assisti ao filme Mera Coincidência, obra que nos oferece matéria interessante para reflexão. O enredo versa sobre um escândalo sexual envolvendo o presidente norte-americano às vésperas das eleições. Uma vez que o episódio poderia comprometer sua reeleição, a equipe presidencial logo trata de contornar ação indecorosa protagonizada pelo chefe maior estadunidense.

Para tanto, Conrad Brean (Robert de Niro), responsável pela imagem do governo, recorre ao produtor hollywoodiano Stanley Motss (Dustin Hoffman). Este então não encontra outro recurso para sanar a crise senão a invenção de um espetáculo que, à medida que desvia a atenção do eleitorado, sobrepõe outra imagem ao governo.

A retórica do espetáculo adotada pela equipe presidencial mostra-nos o quanto que as informações são manipuladas em detrimento da verdade. Mas seria ingenuidade nossa julgar que isto ocorre apenas nos bastidores da política. Além de outros segmentos, há claramente um uso apelativo da imagem no meio evangélico, principalmente no ciclo neo-pentecostal.

Catedrais imponentes são apresentadas em programas televisivos, no esforço de sobrepor a grandiosidade material à mediocridade do discurso. O testemunho de um suposto milagre explorado à sorrelfa. Uma auto-piedade sempre afirmativa, como tentativa de negar fatos que denunciam a índole duvidosa de determinados líderes religiosos. A sublimação da instituição que se projeta para além da crítica; contrastante com denúncias do Ministério Público e inquéritos da Polícia Federal que não passam, na defesa inconstante da cúpula acusada, de perseguição diabólica. Líderes que não mais dialogam com Deus, porque recorreram aos gurus do empreendimento e do discurso motivacional e, até aqui, “o negócio da fé” tem dado certo.

Apelamos para que o cristianismo no Brasil abandone “essa liturgia em 3D”, que não mais causa à alma sulcos de espiritualidade profunda, mas que acentua nosso desencanto niilista.                  

 

domingo, 11 de novembro de 2012


A CONTINUAR ASSIM, EM BREVE RENUNCIAR O EVANGELHO QUE ESTÁ AÍ SERÁ UMA QUESTÃO MORAL

Desnecessário lembra-lhes dos últimos escândalos envolvendo líderes evangélicos. E entendam, “últimos” não porque serão os derradeiros; não tenho tanta esperança assim. Melhor, as denúncias mais recentes que se somam a tantas outras que mancham o evangelho em nosso país, preocupam-me por muitos motivos. Destes, atenho-me à imagem que passa a ser moldada como a que melhor representa os movimentos cristãos em nosso país.

E por ocasião do comportamento desleal “destes senhores do mercado evangélico”, sofrem todos os cristãos que, em sua maioria, possuem uma relação mais sincera com sua fé.  Por conseguinte, confessar nossa fé em determinados meios logo implica em suportar certo vitupério. Tornamos pública nossa profissão religiosa e temos que encarar piadas, chistes e facécias que, entre outras coisas, desmoralizam-nos.  Pior ainda, é nos dar conta de que tais comentários desagradáveis possuem, no mínimo, certa razoabilidade. 

Temo uma espécie de cristianofobia a assolar nosso país; talvez dentro de pouco tempo o assunto entrará na pauta do STF. Obviamente que se trata de um temor exacerbado, mas que reflete o quanto nos sentimos ofendidos. Nós, que cultivamos uma fé sincera e íntegra, padecemos com este paradigma que se constrói à revelia de tudo aquilo que Cristo nos ensinou.  Mais ainda, receio que daqui a algum tempo, continuando as coisas como estão, aderir a certos movimentos religiosos culminará no sacrifício de princípios éticos e morais. Estes princípios constituíram, outrora, o estandarte de nossa fé, e hoje não passam de lembrança nostálgica da época em que exalávamos fragrância agradável; despojada desse miasma composto de desfaçatez e rapinagem dizimeira.     

Clamo aos cristãos deste país, por amor a Cristo, rompam com esses movimentos de massificação evangélicos!

Graça e Paz a todos!

Pr Luis Claudio