sábado, 21 de junho de 2014


PARA SEGUIR A VOZ DE DEUS NO VENTO
 
Uma releitura do livro dos Reis e encontramos talvez com a personagem cuja presença me parece a mas forte: Elias.  Todos os acontecimentos que marcaram sua vida possuem o acento do maravilhoso. Até mesmo seus momentos de abatimento revestem-se do sublime. Sobre a vida desta personagem do Antigo Testamento pouca coisa sabemos, exceto aquilo que está diretamente ligado ao seu ministério.
Exerceu sua vocação profética durante o governo do ímpio rei Acabe. Embora monarca de Israel, os caminhos da nação eram praticamente determinados por Jezabel, sua esposa de origem fenícia que, dentre outras coisas, tornou o culto a Baal a religião oficial. É neste contexto de idolatria paganizada que Elias desempenhará seu ministério, marcado pelo desejo fervoroso de restaurar em sua pátria o culto a Deus.
Por conta de sua luta aparentemente inglória, o profeta vergou-se sob o peso de forte abatimento e desânimo. Sob acusação de lesa-majestade, passou a andar errante escondendo-se dos furores de Jezabel que, impiedosa, procurava tirar-lhe a vida a qualquer custo. Não encontrando mais ânimo para prosseguir, enclausurou-se numa caverna no monte Horeb. Inicia-se então um colóquio entre o profeta abatido e um Deus inspirador.        
Assim que Elias expôs os motivos que o levaram a se trancafiar naquela gruta, Deus o convida a sair e pôr-se na montanha. Segue-se então uma série de fenômenos naturais, marcados por terremotos, fogueiras e furacão. O profeta então busca encontrar seu Deus em meios às pedras fendidas e o crepitar do fogaréu. Porém, Deus lá não estava, manifestando-se em seguida numa brisa suave e leve.    
Há um toque convidativo no soprar daquela brisa, uma vez que terremoto e furacão assustam-nos. Existe na brisa um toque de leveza e suavidade, tal qual a voz de Deus que não se impõe pela entonação, mas pela profundidade do toque. Terremoto e furacão deixam atrás de si um rastro de destruição e morte. A brisa, porém, coloca-nos diante de um Deus que nos chama à vida, ainda que não ignore os momentos sombrios de nossa vida. Deus se revela na brisa porque compreende as nossas chagas; o fenômeno possui uma carga de delicadeza, pois o Senhor não queria ser mais um peso à alma ferida do profeta.
Elias estava tão condicionado às epifanias do Antigo Testamento que, afoito, correu para encontrar Deus num terremoto e labaredas. Foi surpreendido ao constatar a presença divina numa brisa. Há algo aqui que sinaliza para a manifestação graciosa da Encarnação. As imagens que nos reportam a um Deus iracundo, que sempre traz consigo duros juízos, vão sendo substituídas por expressões de ternura e complacência. Ainda que se trate do mesmo Deus, todavia somente com o Cristo Encarnado podemos contemplá-lo numa perspectiva de profundidade.     
A voz de Deus corre solta no vento, deixando suspenso o mistério de sua origem e fim. Séculos após o episódio em tela, Cristo irá comparar a obra de Deus com o “vento que sopra onde quer”, sem que possamos mapear seu trajeto. Por meio desta metáfora, o Redentor quer afirmar que não há padrão para compreendermos o caminho divino. Não existe uma fórmula ou equação, nas quais possamos reduzir os meandros do Senhor.    
Mas os ventos também se relacionam com certa expressão de nossa existência. Isto porque eles nos falam da caminhada. Os ventos eram essenciais para os marinheiros, pois sem eles os navios não singravam as águas. Deus desejava soprar sobre Elias e colocá-lo novamente rumo a terras desconhecidas. Para onde iria, isto pouco importava. Deus iria com ele, e isto bastava.  Assim, para lembrar o verso, se “não podemos dirigir o vento”, ao menos “podemos ajustar as velas”.     
 
Graça e Paz a todos!
Pr Luis Claudio     

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