E ELE APARECEU A MARIA
MADALENA!
Dentre outras testemunhas
que contemplaram o Cristo ressurreto, encontramos uma mulher universalmente
conhecida como Maria Madalena. Detalhes sobre este encontro podem ser lidos no
Evangelho Segundo escreveu João (20.11-18). E quando me coloco a pensar nas
razões que levaram Cristo a se manifestar a Maria Madalena, logo após sua
Ressurreição, confesso ficar bastante intrigado. A escolha torna-se um pouco
mais clara quando a contraponho às consequências que adviriam se Cristo
manifestasse a outras figuras, e não àquela mulher.
Se partirmos da importância
jurídica da Ressurreição, deveríamos supor que seria mais conveniente que
Cristo se apresentasse a um advogado ou juiz romano. Todavia, talvez, este logo
trataria de denunciá-lo novamente, uma vez que a Ressurreição não anularia,
juridicamente, a pena que lhe fora imposta. O evento não exigiria uma revisão
do processo, uma vez que ele não removeria o suposto crime de Cristo; mas quiçá
apenas revelaria a ineficiência do instrumento utilizado para a execução da
sentença.
Se Cristo tivesse se
manifestado a um médico legista, este logo afirmaria que, de fato, ele estava
vivo. Entretanto, a hipótese da Ressurreição poderia ser facilmente substituída
por um desmaio na cruz, e não a morte clínica do condenado. Um legista ligado
aos interesses romanos ou sinedritas atestaria despudoradamente este parecer
clínico. A consciência traída pode encontrar paliativo à sua culpa em atos que
legitimem uma razão supostamente mais nobre.
Se tivesse aparecido a
Pôncio Pilatos, estaria instalado o caos político no império. E o evento
deixaria de ser tratado na perspectiva da ordem espiritual para a ordem
temporal. Logo procurariam torná-lo um novo césar colocando-o, por assim dizer,
na mesma perspectiva dos reis deste mundo. Isto ele já havia rejeitado em
Cafarnaum. De sorte que concorrer com os césares reduziria substancialmente sua
grandeza, uma vez que seu desejo é ser acolhido em nossos corações, e não
ascender aos nossos tronos.
Se Cristo tivesse
manifestado-se ao Sumo Sacerdote, sua presença logo ameaçaria uma organização
milenar em Israel. Isto porque não haveria necessidade em manter a ordem
sacerdotal, haja visto o sacrifício perfeito e definitivo ter sido oferecido. A
Ressurreição não se contenta apenas no confronto com instituições. O próprio
tempo cuida em mostrar suas lacunas e a necessidade de renovação.
Cristo se mostra a uma
mulher desarmada, que vai a ele com o despojamento de um discípulo; que se
relacionaria com aquele evento na perspectiva da fé, e não de interesses
alheios. Que não assimila aquele evento enquanto uma ameaça à ordem
estabelecida. Antes, que reconhece nele o sentido mais profundo a apaziguar
todo seu caos existencial.
Cristo se mostra a uma
mulher que se convence da veracidade de seu encontro não por evidências
científicas, mas pela intensidade vívida de sua realidade. Porque a ciência não
apreende a totalidade de todas as coisas, mas apenas uma parcela ínfima delas.
Alinha-se a esta constatação um dos mais célebres versos shakespearianos: “Há
tanta coisa entre o Céu e a Terra que não compreende a nossa vã
filosofia”.
Cristo se mostra a uma
mulher cujo anúncio da Ressurreição não será mais que o transbordar jubiloso e
incontido da alma. Cristo mostra-se a Maria Madalena, pois sabe que aquela
mulher não iria reduzir o maravilhoso a pressupostos racionais. Talvez Maria represente
esta nossa humanidade que ainda se deleita naquele sentimento despertado frente
ao maravilhoso. Que se lança aos pés de seu Cristo com aquela paixão que não balouça,
ainda que pareça mais razoável, diante das conveniências que pretendem
sufocá-la.
Graça e Paz a todos
Pr Luis Claudio